quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Homenagem a um anjo

Vejam que bonita a homenagem do Luiz Eduardo Franco a Zuzu Angel...


Texto originalmente publicado no blog http://luizfranco-eduardo.blogspot.com/


"Hoje você é quem manda
Falou,tá falado
Não tem discussão,não
A minha gente hoje anda
Falando de lado e
E olhando pro chão,viu".

Anos 70.Anos de chumbo,de ferro...de supressão das liberdades,das vozes caladas a força...
Anos da contenção e aprisionamento dos sentimentos,das opiniões...
Anos do "eu"que deixa de "ser"e de "existir".
A repressão anula e destrói a alegria de viver...

"Por esse pão prá comer
Por esse chão prá dormir
A certidão prá nascer e a concessão prá sorrir
Por me deixar respirar
Por me deixar existir
Deus lhe pague".


Deveríamos agradecer por tudo que fosse "bom"e também pelo que era insofismavelmente
"mau".Deveríamos agradecer por tudo que nos fosse de direito,como também por aquilo que nos fosse impingido,empurrado guela abaixo,sem opção de escolha.
Deste modo,deveríamos agradecer e estar felizes pela "fumaça desgraça que a gente tem que tossir"(alusão à poluição atmosférica do crescimento desordenado das metrópoles capitalistas),pelos "andaimes pingentes que a gente tem que cair"(menção clara às ignóbeis condições de trabalho,aqui exemplificada na construção civil,mas não sómente nela),e ainda agradecer pela "cachaça de graça",o "samba prá distrair"e o "futebol prá aplaudir".
Concessões,dádivas,benesses,regalias "proporcionadas"pelo sistema.
E é nesse meio,nesse emaranhado de acontecimentos(ou desacontecimentos),que surge "Angélica".

"Quem é essa mulher
Que canta sempre esse estribilho?
Só queria embalar meu filho
Que mora na escuridão do mar.

Quem é essa mulher
Que canta sempre esse lamento?
Só queria lembrar o tormento
Que fez meu filho suspirar.

Quem é essa mulher
Que canta sempre o mesmo arranjo?
Só queria agasalhar meu anjo
E deixar seu corpo descansar.

Quem é essa mulher
Que canta como dobra um sino?
Queria cantar por meu menino
Que ele já não pode mais cantar".

"Quem é essa mulher"?...
Verso que se repete,iniciando as quatro estrofes de mais essa canção de Chico Buarque de Hollanda,desta vez em parceria com Miltinho,do MPB4,para frisar,marcar,delinear a força e personalidade de uma mulher,mãe,empresária,estilista renomada,mas acima de tudo...gente.
Mulher,mãe,empresária,estilista,artista criadora e renovadora,que se deu por inteiro e completo à cada uma dessas condições do "ser humano".
Sua arte,suas criações,sua genialidade,não estavam voltadas apenas para a elite,mas também para as grandes massas,pois ela almejava(e conseguiu,com altivez e fidalguia)vestir também a mulher comum,brasileira ou estrangeira simples,do povo.
E sua arte tinha um toque especial,um "quê" muito particular que a diferenciava.
Ela levou para a moda um sentido de "brasilidade",com elementos da fauna,da flora,das águas brasileiras...

"Quem é essa mulher?"
Repete-se o verso e a pergunta...
Essa mulher chamava-se Zuleika Angel Jones,ou simplesmente,Zuzu Angel...
Mãe dedicada e extremada,que muito lutou,desesperadamente,sem medir esforços,sacrifícios ou consequências,para poder solucionar o desaparecimento e paradeiro final de Stuart Edgard Angel Jones,seu filho,estudante de Economia da UFRJ e militante político do
MR-8,que fora feito preso político em 1971.
Veio a saber depois de muita luta a barbárie de que fora vítima o amado filho,e passou a fazer desse acontecimento trágico e doloroso,uma forma de protesto,e,ao mesmo tempo,de homenagem à seu filho querido.
Incorporou à sua arte essa forma de protesto,denúncia e homenagem.
E essa grande mulher e mãe terminou por pagar com a própria vida essa sua "ousadia",vítima que foi de um acidente automobilístico bastante suspeito e obscuro,em 1976.
Isso por apenas desejar "agasalhar meu anjo e deixar seu corpo descansar",e por ansiar "cantar por meu menino,que ele já não pode mais cantar".
O lirismo,a força poética e o componente traumático estão aqui bem presentes nessa canção,feita em homenagem à uma mulher excepcional,chamada Zuleika Angel Jones.Ou,simplesmente,a nossa saudosa e eterna,Zuzu Angel!...

E, como disse Bertolt Brecht,"há de se cantar os tempos de trevas".

Texto entremeado por canções como:"Apesar de Você",de Chico Buarque de Hollanda,"Deus lhe Pague",de Chico Buarque de Hollanda e "Angélica",de Chico Buarque de Hollanda e Miltinho.

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