A moda do Re-Usar, por Samantha Pinotti
Diz o ditado que nada se cria, tudo se copia. Na moda tudo
se re-cria.
E se ao invés de copiarmos ou re-criarmos, usássemos a
política do re-usar?
Se a moda é cíclica, por que relançar uma nova coleção a
cada três meses para re-ciclar uma ideia antiga?
Segundo Gilles Lipovetsky:
“Estamos destinados à instabilidade crônica dos valores, aos
vai-e-vens das ações e reações, ao “eterno” retorno da moda que não cessa de
reciclar na modernidade as formas e valores antigos...Certamente é possível
re-situar este momento em um destes ciclos periódicos da história moderna.”
Mas que momento é esse? O que seria reciclar na modernidade
as formas e valores antigos?
Para os estilistas e a indústria têxtil reciclar tem outro
sentido que não o verdadeiro da palavra. Para eles “reciclar” é fazer uma
releitura, é inovar o velho. É a ação sem pensar nas consequências futuras da
reação.
A moda do século XX foi marcada de acordo com os
acontecimentos e necessidades de cada década. Podemos tomar como exemplo o New
Look de Cristian Dior (1947) que associado à empresa têxtil Boussac, lançou uma
linha de vestidos revolucionária, mandando uma mensagem às mulheres: “comprem
mais panos”. A mulher do pós-guerra mudou e, com ela, suas roupas. As saias
rodadas da década de 50, a mini-saia de Mary Quant nos anos 60 mostrando a
liberdade feminina, o estilo hippie e o blue jeans dos anos 70, são alguns dos
exemplos do encontro da moda com as necessidades de cada época.
E hoje, qual é a nossa necessidade? Quais os acontecimentos
que podem liderar uma revolução na moda atual?
Vivemos numa época de “fastfashion” onde compramos para
satisfazer nossos desejos ou fugir das frustrações pessoais. As mulheres trocam
seu guarda-roupas a cada seis meses, sem pensar nas consequências deste
“consumir por consumir”, simplesmente para acompanhar a moda que, como já
vimos, nada mais é do que uma re-criação do que já foi voga um dia.
As ideias são quase as mesmas, todas tem um ar retrô, vintage,
um pé no passado. Apesar de a tecnologia ter invadido o mundo da moda, os
saudosistas andam com mais sorte, pois a releitura sempre vinga e vende mais.
Mas novamente eu me pergunto, qual é a nossa necessidade?
Buscar no consumo a resolução para todos os sofrimentos já
se mostrou um conceito fracassado. Quanto mais temos, mais queremos. E é
exatamente isso que o mercado da moda espera de nós. Mas já aviso: é uma
cilada. Temos que aderir a uma nova politica, diferente da do “ter”, a do
“ser”.
Quando vemos um vestido numa vitrine ou vestindo uma linda
modelo na capa de uma revista, geramos em nós a necessidade do consumo, “eles”
geraram em nós o desejo de consumo. Por alguns instantes pensamos que ter
aquele vestido pode melhorar o nosso dia. Ledo engano. Os problemas ficam, o
dinheiro vai embora, o mercado da moda agradece e a natureza mais uma vez
chora.
Espera aí! O que a natureza tem a ver com isso?
Simples, chegamos ao ponto da necessidade da nossa década: A
necessidade de consciência!
Há alguns anos os termos “ecológico” e “eco-sustentável” não
estavam em pauta. Ainda não tínhamos percebido que os recursos da natureza são,
na sua maioria, não renováveis e nos preocupávamos apenas em retratar a nossa
realidade nas nossas roupas. Sim a moda é documento histórico, mas é também um
atual problema de sustentabilidade ambiental.
“O problema da poluição ambiental tem caráter mundial e vem
exigindo ações preventivas e corretivas para situá-lo em níveis aceitáveis,
compatíveis com a preservação da qualidade de vida. Dentre as atividades
industriais poluentes temos a têxtil, geradora de alta carga residual conhecida
como lodo, e frequentemente emissora de efluente tratado que não atende ao
parâmetro de controle ambiental cor, para o qual é exigido virtual ausência.
Vários processos e produtos podem ser empregados para a remoção de cor, tais
como adsorção, coagulação, técnicas biológicas e oxidação química,
destacando-se a utilização de alúmen ou sais ferrosos com polieletrólitos, os
quais têm o inconveniente de gerar lodos inorgânicos.” (Magali O. Bonatti,
Ricardo A. Rebelo e Ivonete Barcellos)
Resumindo a indústria têxtil polui, a indústria têxtil usa
recursos não renováveis e o pior de tudo: produz demais. Não vamos nem entrar
nos detalhes e falar do trabalho escravo nas indústrias têxteis na China ou
para onde vão todas estas roupas quando saem da moda... Mesmo com toda a
tecnologia atual a moda não é mais uma necessidade de retratar a nossa época.
Ela é exclusiva, para poucos que têm poder aquisitivo de renovar o closet a
cada estação e depois dar um fim para o que é “velho”.
Por isso, sem mais delongas, a minha proposta para a moda
atual não é re-criar, re-ciclar e comprar mais do mesmo toda estação. A minha
proposta é re-usar. “Certamente é possível re-situar este momento em um destes
ciclos periódicos da história moderna”.
Se a moda é cíclica e o antigo é moderno, porque não usarmos
as roupas que já compramos na outra estação? Roupas que eram das nossas mães,
roupas que podem ser re-usadas, compradas em ótimo estado em brechós? Porque
não Re-usar? Afinal, nada esta mais na moda que ser sustentável, não é mesmo? E
nada como um toque pessoal no look, com pequenas mudanças e acessórios podemos
transformar o velho em novo, o antigo em retrô, o usado em vintage!
Vamos nessa? Vamos transformar a moda da nossa década na
moda do re-usar, re-aproveitar?
Não estou dizendo que devemos parar de consumir moda ou
quebrar o mercado de luxo. Estou falando em consumir com consciência. Pesquisar
se a roupa que você esta comprando foi feita da maneira mais ecologicamente
correta possível, sem deixar-se enganar por selos verdes. O capitalismo verde
esta aí para nos fazer consumir e pensar que estamos consumindo bem. Então
pesquise, compre com consciência e SEMPRE que puder, re-use!
Nas fotos abaixo, Samantha veste roupas reformadas que pertenceram à sua mãe, avó, irmã e tia avó. Vejam como compõem looks atuais...